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Gaza Project /História de Fadi, jornalista gravemente ferido em pleno exercício da profissão

Gaza Project /História de Fadi, jornalista gravemente ferido em pleno exercício da profissão

(ANG) – A RFI é um dos doze meios de comunicação social internacionais que participa no Gaza Project, uma iniciativa do consórcio Forbidden Stories, que reúne cerca de quarenta jornalistas e especialistas.

Trata-se de uma investigação colaborativa sobre as ameaças aos jornalistas palestinianos que cobrem a guerra na Faixa de Gaza desde Outubro de 2023. Esta quinta-feira, a história de Fadi al-Wahidi.

Esta quinta-feira, a história de Fadi al-Wahidi, paralisado desde que foi atingido no pescoço por uma bala. A reconstrução minuciosa dos factos mostra que Fadi era perfeitamente identificável como jornalista.

O jovem palestiniano encontra-se imobilizado numa cama de um hospital, no Cairo, Egipto. Fadi al-Wahidi, de 25 anos, não sabe se voltará a pôr-se de pé e a andar. A 09 de Outubro de 2024, foi baleado no pescoço, entre a segunda e a terceira vértebra. Resultado: uma grave lesão na medula espinal que lhe provocou a paralisia das duas pernas.

A minha medula espinal foi fracturada. Por causa disso, sou paraplégico“, explica Fadi, que os jornalistas do Forbidden Stories conseguiram entrevistar várias vezes. “Sinto, constantemente, descargas eléctricas nas mãos. É uma sensação constante, que não desaparece. Impede-me de dormir à noite e, por vezes, até durante o dia. Os analgésicos não fazem efeito“, acrescenta o jovem jornalista, atingido em pleno exercício da profissão.

Fotografias tiradas poucos meses antes mostram Fadi al-Wahidi de pé, com um colete azul marcado com as letras “Press” [Imprensa]. Foi no Outono: o repórter de imagem do canal de televisão Al Jazeera, trabalhava sobre a situação dos palestinianos do norte da Faixa de Gaza, forçados a fugir devido à ofensiva israelita.

“Nesse dia, decorria uma operação terrestre. Eu estava lá apenas para filmar o meu colega Anas al-Sharif, que fazia uma reportagem sobre o deslocamento das populações”, relata. Fadi documentava a guerra que assolava as ruas que bem conhecia : é natural de Jabalia, onde decorria a ofensiva israelita.

“Tínhamos ouvido dizer que bombardeamentos aleatórios tinham atingido habitações civis”, recorda. “As pessoas fugiram à pressa, de mãos vazias. Nesse dia, ninguém sabia onde procurar refúgio. Lembro-me de que as pessoas estavam simplesmente sentadas no chão, por não haver outra opção”.

Várias equipas de jornalistas, incluindo a da Al Jazeera – com Fadi e Anas al-Sharif – estavam no bairro de al-Saftawi para cobrir os acontecimentos quando começaram os disparos. O momento foi filmado pelo próprio Fadi, que em vídeo capturou o instante em que os colegas tentam fugir do perigo. Dezasseis segundos de corrida desenfreada pelas ruas de Gaza. A última imagem é o rosto do jovem repórter de imagem.

“Até agora, esses tiros ainda ressoam nos meus ouvidos”, conta Fadi. “Balas que assobiam e fazem ricochete nas portas e paredes ao meu lado. Queriam matar-nos, a mim e aos meus colegas, visando-nos directamente”.

Fadi perdeu os sentidos. Um vídeo mostra-o caído no chão, de bruços. Durante muito tempo, os colegas não o conseguiram socorrer, devido ao risco de serem atingidos. Outra gravação mostra quatro homens a retirar do local o corpo do repórter inanimado. Fadi, ainda com o colete “Press” [Imprensa], foi levado para um carro e transportado para o hospital al-Shifa, em Gaza.

O Forbidden Stories teve acesso ao processo clínico de Fadi e entrevistou o médico que o operou, que confirmou a lesão por bala no pescoço, os danos na medula espinal e a paralisia das duas pernas.

Fadi foi atingido fora de uma zona assinalada para evacuação. Na véspera, a 08 de Outubro de 2024, o exército israelita publicou na rede social X, em árabe, um mapa que indicava operações militares no campo de refugiados de Jabalia. A mensagem instava os habitantes a abandonarem “imediatamente” a zona e a dirigirem-se para o sul da Faixa de Gaza, acrescentando que as “forças da 162ª divisão iriam operar nesse sector por via aérea e terrestre”.

Através de ferramentas de geolocalização, a investigação do Forbidden Stories confirma que as equipas de televisão, incluindo a da Al Jazeera – com Fadi e Anas –, estavam fora dessa zona a 09 de Outubro, dia em que Fadi foi gravemente ferido. Além dos coletes “Press” [Imprensa], os jornalistas tinham instalado equipamento de transmissão de imagens, o que os identificava claramente como profissionais de informação.

Fadi foi atingido por um atirador humano ou por um drone? A questão continua sem resposta, mas testemunhas confirmam a presença de drones no momento do disparo.

“Enquanto filmávamos, um drone de reconhecimento começou a disparar sobre nós”, recorda Anas al-Sharif, jornalista da Al Jazeera e colega de Fadi.

Islam Bader e Mohammed Shaheen, outros jornalistas palestinianos presentes no local, também garantem: “Sem sombra de dúvida, tratava-se de um quadricóptero [drone]”, afirma Islam Bader. “Durante a guerra, habituámo-nos a reconhecer o som desses drones”, acrescenta Mohammed Shaheen.

Contactado para a investigação, o exército israelita não respondeu às perguntas sobre se esses dispositivos foram utilizados em Gaza e rejeitou as acusações de ataques sistemáticos contra jornalistas. Israel reitera atacar apenas “membros de grupos armados e indivíduos que participam directamente nas hostilidades”.

Gravemente ferido, Fadi recebeu tratamento na Faixa de Gaza, tendo sido, várias vezes, transferido de hospital devido à escassez de medicamentos.

Apesar da gravidade das lesões, as autoridades israelitas recusaram a transferência  “por razões de segurança” de Fadi para o Egipto. 

A situação apenas se desbloqueou em Fevereiro de 2025, após o cessar-fogo de 19 de Janeiro. Foram necessários 122 dias para que Fadi fosse transferido para o Egipto, onde se encontra a recebr tratamento médico.

Segundo o Comité para a Protecção dos Jornalistas, quase 170 profissionais de comunicação social foram mortos na Faixa de Gaza desde o início da guerra, Outubro de 2023. Poucos dias antes da publicação desta investigação, Hossam Shabat, jornalista palestiniano da Al Jazeera, foi morto num ataque israelita, em Beit Lahya.ANG/RFI

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