Portugal/Fórum China-África será marcado pelo reforço do “alinhamento político” – analistas
(ANG) – Analistas contactados pela Lusa estimam que o próximo Fórum de Cooperação China-África será marcado pelo reforço do “alinhamento político” entre Pequim e o continente africano e por uma “maior clareza em relação à iniciativa chinesa de segurança global”.
Cinquenta e quatro representantes africanos, incluindo numerosos chefes de Estado e de Governo, assim como largas centenas de ministros setoriais estarão esta semana em Pequim para o 9.º Fórum de Cooperação China-África (FOCAC, na sigla em inglês, que se realiza trianualmente desde outubro de 2000), numa cimeira de mais alto nível do que a realizada em 2021 em Dacar, em plena pandemia de covid.
“Todas as embaixadas em Pequim estão completamente ocupadas com o fórum, todos os governos africanos estão ocupados. Há mais presidentes africanos a participar no FOCAC do que na Assembleia Geral da ONU, que é a maior cimeira do mundo. O FOCAC é o ponto mais importante do calendário diplomático de África”, sublinha Paul Nantulya, investigador do Africa Center for Strategic Studies (ACSS), especialista nas relações África-China.
Apesar das numerosas representações de alto nível e do “reforço do prestígio” deste FOCAC em relação ao anterior, Jana de Kluiver, investigadora do Institute for Strategic Studies (ISS), em Pretória, prevê que esta primeira cimeira pós-covid não será marcada pelo aumento da “dimensão do investimentos” anunciados.
Em primeiro lugar, refere, porque a China “está consciente do problema da dívida em África e da forma como a situação se apresenta a nível internacional”, e depois, porque se espera este ano um maior envolvimento do setor privado, o que “coloca uma maior ênfase na rentabilidade dos projetos, o que implica projetos mais pequenos, com um retorno mais rápido”.
Em contrapartida, Kluiver acredita que se irá assistir ao anúncio do investimento em projetos de energias renováveis e no aumento de projetos relacionados com o “Crescimento Verde”, assim mais investimento tecnológico, em alinhamento com os objetivos internos da China.
Um e outro analista apontam também a importância que deverão assumir as três grandes iniciativas anunciadas pelo Presidente chinês, Xi Jiping, já depois do último FOCAC de 2021, a saber, Iniciativa de Segurança Global (ISG), Iniciativa de Desenvolvimento Global (IDG) e Iniciativa de Civilização Global (ICG).
“Um elemento importante que sairá deste FOCAC é o alinhamento político”, sublinha Nantulya. “A China está a procurar um alinhamento político mais forte com os países africanos, como parte da sua estratégia para o Sul Global, que vê como uma espécie de contrapeso ao que chama o sistema internacional dominado pelo Ocidente”, acrescenta o investigador.
“Penso que teremos uma maior clareza sobre a nova ISG e a IDG, em particular; Este FOCAC será marcado pelo elemento da segurança, e na forma como Pequim tenta remodelar a ordem internacional” através destas iniciativas, afirmou Jana de Kluiver.
Nantulya sublinha que os países africanos têm vindo a reclamar uma reforma do sistema multilateral, que inclua, nomeadamente, uma representação permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, mas a China “não tem sido muito clara na sua posição” sobre este tema.
A estas exigências por parte dos países africanos, a China tem respondido com a promessa ajudar a “ampliar a sua influência e os seus interesses a nível internacional, por exemplo, defendendo os pedidos de mais financiamento para o desenvolvimento”, acrescenta o investigador.
“A China está a criar muitas organizações internacionais, muitas das quais são paralelas a organizações internacionais existentes, como o Banco Asiático de Investimento em Infraestruturas, de que muitos países africanos são membros, ou o novo Banco de Desenvolvimento, que funciona no âmbito dos BRICS, e outras organizações de que os países africanos fazem parte”, ilustrou ainda.
Finalmente, ambos os analistas apontam falha importante que representa a falta, mais uma vez, de uma estratégia comum dos países africanos para negociações com um gigante como a China.
“África não tem uma posição comum em relação à China, nem em relação a qualquer ator externo. Há certas orientações continentais que seriam altamente positivas, se os países e os seus compromissos bilaterais com a China pudessem ter em mente o quadro mais vasto do desenvolvimento do continente”, diz Kluiver.
“Mas não existe uma agenda definida ou uma abordagem comum, o que prejudica os países africanos, em termos do seu poder de negociação”, acrescentou.
A China dispõe de muitos recursos, especificamente em termos de desenvolvimento da conectividade, tecnologias de informação e comunicação, recursos humanos, bem como de financiamento de projetos, mas, para que pudesse realmente ser aproveitado, seria preciso que os países africanos alcançassem um “nível de coordenação” mínimo, que lhes permitisse, por exemplo, articular de forma eficaz grandes projetos como o Acordo de Comércio Livre Continental Africano e a iniciativa chinesa “Uma Faixa, Uma Rota”, sublinha a analista sul-africana.
É fundamental, sublinha Kluiver, que “exista um nível de concordância” entre os países africanos, que “garanta que estes grandes projetos estão alinhados, porque é importante desenvolver projetos de infraestruturas regionais que, em última análise, promovam o comércio intra-africano e não se limitem a reforçar as cadeias de valor e as ligações com, por exemplo, a China ou qualquer potência externa”. ANG/Inforpress/Lusa