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França/Alternativas ao plástico podem gerar mais gases com efeito de estufa que o próprio plástico

França/Alternativas ao plástico podem gerar mais gases com efeito de estufa que o próprio plástico

 (ANG) – As alternativas ao plástico podem gerar mais gases com efeito de estufa que o próprio plástico, concluiu um estudo publicado na revista Environmental Science & Technology.

Miguel Brandão, co-autor do artigo, explica que este estudo “compara as maiores aplicações do plástico com os substitutos para perceber os impactos no clima”: “se ao substituirmos um pelo outro há ganhos ou perdas no sentido de mudanças climáticas”.

Os plásticos são responsáveis por 4,5% das emissões globais de gases com efeito de estufa (GEE). Devido à ameaça que representam para a biodiversidade e para a saúde ambiental e pública, a eliminação dos plásticos transformou-se numa urgência dos diferentes poderes políticos.

Os plásticos são controversos devido à sua produção a partir de combustíveis fósseis, às emissões durante a produção e eliminação, à potencial toxicidade e à contaminação do ambiente. Face a estas preocupações é comum apelar-se à redução da utilização do plástico e ao aumento do recurso a alternativas não plásticas. Todavia, estes apelos, muito transformados em leis, vastas vezes ignoram os impactos ambientais dos materiais alternativos.

Acaba de ser publicado na revista Environmental Science & Technology, assinado por Fanran Meng, Miguel Brandão e Jonathan M Cullen, um estudo que revela que na maior parte dos casos, os produtos utilizados para substituir o plástico geram ainda mais impactos no clima. O documento não se debruça sobre o impacto do plástico na saúde ou poluição marítima, avalia única e exclusivamente as emissões de GEE dos produtos de plástico e das suas alternativas ao longo do ciclo de vida.

Miguel Brandão, co-autor do artigo, explica que este estudo “compara as maiores aplicações do plástico com os substitutos para perceber os impactos no clima”: “se ao substituirmos um pelo outro há ganhos ou perdas no sentido de mudanças climáticas”.

O professor de Ecologia Industrial e Avaliação de Ciclo de Vida no KTH Royal Institute of Technology (Instituto Real de Tecnologia) em Estocolmo, Suécia, sublinha que “seria limitativo descartar o plástico sem se ter a noção de que os seus substitutos possam ser piores, pelo menos no que diz respeito ao clima.”

O cientista defende a necessidade de uma visão “holística, sistemática, compreensiva e com base na ciência” que olhe para o ciclo de vida do produto de forma a evitar a troca de um produto mau, por outro ainda pior.

RFI: Peço-lhe que me dê as linhas gerais deste estudo.

Miguel Brandão: O que nós fizemos foi comparar as aplicações mais representativas do plástico com os substitutos mais comuns em cada uma dessas aplicações e estimar o impacto no clima, tanto dos plásticos como das alternativas ao longo do ciclo de vida, para sabermos se ao substituirmos plásticos pelos substitutos haveria ganhos ou perdas no sentido de mudanças climáticas.

Este artigo recentemente publicado demonstra que na maior parte das aplicações as alternativas ao plástico têm um impacto no clima superior.

Nós não defendemos o uso de plásticos, porque aliás há muitos impactos que vão para além das mudanças no clima, como por exemplo, o tema dos microplásticos e da poluição marinha, mas em termos de mudanças climáticas, realmente o plástico parece ser um material bastante eficiente e seria limitativo descartar o plástico sem ter a noção de que os seus substitutos possam ser piores, pelo menos no que diz respeito ao clima.

Portanto, o estudo avalia precisamente o impacto do plástico na emissão de gases com efeito de estufa. Não na questão do impacto do plástico na saúde humana, microplásticos, poluição marinha… mas na emissão dos gases com efeito de estufa?

Exactamente. Portanto, [compara as emissões de gases com efeito de estufa] ao longo do ciclo de vida dos plásticos e dos substitutos.

Em termos climáticos, o plástico parece ser um material menos mau, mas há bastantes impactos adicionais às mudanças climáticas, como por exemplo, os que mencionou [saúde humana, microplásticos, poluição marinha].

Nós, quando fazemos avaliações de ciclo de vida, é normal considerarmos 16 tipos de impactos, as mudanças climáticas são somente um.

É claro que as mudanças climáticas estão a ter um grande foco e é urgente lidar com isso, mas isso não quer dizer que não haja outros impactos urgentes ou importantes.

Nós limitamos a nossa análise às mudanças climáticas, portanto, as nossas conclusões mantêm-se no que diz respeito às alterações climáticas, isto é, na maior parte dos casos, os plásticos são realmente melhor que os seus substitutos, mas se o seu foco for noutro impacto ambiental qualquer ou na saúde humana, aí as nossas conclusões poderiam já não se manter.

Analisaram a questão do plástico e as alternativas em diferentes sectores, como a indústria têxtil, automóvel, construção civil, mobiliário e também na parte das embalagens. Há uma questão que penso que é transversal no artigo e nestas áreas: uma das vantagens do plástico tem a ver precisamente com o peso.

Sim, o plástico é um material bastante eficiente. Se comparar, por exemplo, um uso muito corriqueiro do plástico, o saco de plástico, é óptimo quando comparado com as suas alternativas, por exemplo um saco de pano ou até um saco de papel. O saco de papel pode ser utilizado uma ou duas vezes, se o papel se molhar fica inviável. Já não o pode usar outra vez, tem que deitar fora. E não se esqueça que para produzir o papel é preciso que uma árvore tenha sido plantada, colhida, processada e isso tudo acarreta impactos ambientais.

O saco de plástico, como tem uma longevidade grande comparado com as suas alternativas e é produzido a partir de co-produtos da indústria petrolífera, acaba por ser bastante eficiente. É um material resistente, à prova de água, é bastante leve e ocupa pouco espaço. Portanto, sim, sem preconceitos, acaba realmente por ser um material bastante útil e é exactamente por isso que é usado à escala em que é.

Sobre a retirada dos sacos plásticos do supermercado. Acabou por haver aqui uma política que não olhou para toda a cadeia. Ou seja, não foram feitos estudos suficientes para efectivamente se perceber se havia um benefício ou não para o clima.

É exactamente isso. Eu dou aulas numa universidadee um dos cursos chama-se Análise Ambiental de Sistemas e Tomada de Decisão. Uma das coisas que eu partilho com os meus alunos na minha primeira aula é que aquelas coisas que um leigo – ou um não leigo – pensa intuitivamente serem necessariamente melhor ambientalmente, como por exemplo, alimentos locais ou biológicos ou materiais e combustíveis feitos a partir da biomassa como biocombustíveis serem sempre melhores do que as suas alternativas.

Eu compreendo que assim seja, mas é preciso fazer as contas para informar as nossas decisões, não podemos estar susceptíveis àquilo que é intuitivo.

Aí, vemos que realmente livre de preconceitos, essas alternativas que nós pensamos ser melhor, nem sempre o são.

É isso que nós tentamos fazer: olhar para as coisas de uma maneira holística, de uma maneira sistemática e compreensiva e com base na ciência.

No caso dos plásticos, acho que é daquelas coisas que as pessoas acham que é óbvio, quando não é assim tão óbvio, e acabam por tomar decisões contraproducentes no que respeita pelo menos a alguns impactos. Não todos, porque realmente o problema da poluição marinha é real, não é inventado. Portanto, se quisermos resolver realmente problemas associados à poluição marinha, muito bem, podemos evitar os plásticos desde que tenhamos consciência de que as emissões de gases de estufa aumentarão. Agora, o que é importante é realmente haver essa coerência e não aparentar resolver um problema sem ter noção que criamos outros.

Ou seja, como cobrir um problema com uma manta e há sempre um canto que fica de fora.

Exacto, fica outro problema a descoberto. Não necessariamente o mesmo, mas outro problema, como neste caso as mudanças climáticas. Podemos argumentar que é talvez mais urgente do que poluição marinha. Não há uma maneira objectiva de o dizer, mas o importante é olhar para as coisas na sua extensão total, exactamente para não estarmos a criar problemas sem o saber. Ao menos que saibamos e tomemos uma decisão consciente. Portanto, em vez de pensarmos em banir totalmente e na reutilização, temos também que pensar na substituição.

Por exemplo, se vamos realmente banir os sacos de plástico dos supermercados, estejamos cientes de que os alternativos sacos de pano levem 20 ou 30 anos de uso até pouparem custos ambientais equivalentes aos sacos de plástico.

Nesta questão do plástico e das alternativas. Portanto, neste momento, no estado actual das coisas, pensa que é necessário que os próprios governos repensem a política em relação ao plástico e das possíveis alternativas?

Eu não sei até que ponto é que as políticas possam ser reversíveis, mas acho que temos que ter humildade para mudar de opinião consoante o que nos diz a ciência moderna. Por exemplo, tínhamos objectivos muito ambiciosos para os biocombustíveis que foram sujeitos a alguma reversão porque realmente era uma política contraproducente. Corríamos o risco de acabar por ter mais emissões do que se não adoptássemos essa política, o que não faria muito sentido.

Acho que há espaço para admitirmos falhas e para alterarmos um curso que agora se sabe ser pouco producente. Banir plásticos pode ser uma política exagerada se resultar num nível superior de emissões de gases de estufa (- acho que é óbvio).ANG/RFI

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